Artigo: A prisão, a mídia e os direitos humanos

Por | 6/12/2013

Em 10 de dezembro comemora-se o Dia Internacional dos Direitos Humanos. A data marca a promulgação da Declaração Internacional dos Direitos Humanos, em 1948. O documento foi elaborado sob o impacto dos horrores praticados na 2ª Guerra Mundial, como tentativa de evitar que seres humanos fossem novamente tratados com crueldade.

O documento afirma o direito universal à vida, à liberdade e ao acesso a bens econômicos, sociais e culturais. São 30 artigos que, objetivamente, definem a relação que deve existir entre Estado e sociedade civil – direitos e deveres.

Embora o Brasil tenha aderido à Declaração dos Direitos Humanos e às demais normas internacionais que ratificam o documento, comprometendo-se a obedecer e colocar em prática cada um dos artigos, o termo direitos humanos ficou conhecido entre nós apenas na década de 1970, durante a Ditadura Militar.

Naquele período, os filhos da classe média foram presos por seu envolvimento na resistência à ditadura militar e submetidos ao mesmo tratamento dispensado aos presos comuns. Seus familiares e amigos ficaram horrorizados com os maus tratos, torturas e privações impostas e se mobilizaram, invocando os direitos humanos.

As igrejas, presentes nas prisões desde sempre, pessoas e entidades da sociedade civil, lideradas pela igreja católica e organizadas na Comissão Justiça e Paz, da Arquidiocese de São Paulo, denunciaram as arbitrariedades interna e externamente.

Até mesmo a imprensa comercial, que apoiou o golpe militar sempre de olho nas vantagens econômicas e manutenção de status quo, colocou-se – na medida que sua subserviência permitia –, contra a tortura e as condições sub-humanas das prisões. É bem verdade, a preocupação era com seus iguais, os filhos da classe média, mas o movimento terminou por jogar luz na crueldade imposta pelo Estado às pessoas que estão sob sua tutela.

Os grupos coniventes com as arbitrariedades espalham, desde então, a ideia de que “a turma dos direitos humanos só defende bandido”. Esta frase é repetida à exaustão pela mídia, agentes públicos violentos e pessoas comuns que, distantes da realidade das prisões, desinformadas sobre sua ineficácia e ineficiência no combate à violência e, envenenadas pela ideia de vingança, clamam por mais e mais violência do Estado contra os indivíduos.

Neste 10 de Dezembro teremos pouco a comemorar no Brasil. Aliás, vamos registrar um tremendo retrocesso na afirmação histórica dos Direitos Humanos em nosso país. A prisão dos envolvidos na Ação Penal nº 470 tem provocado reações agressivas.

Diferentemente do ocorrido na década de 1970, quando setores da classe média, incluindo a imprensa comercial, denunciaram e colocaram-se contra os maus tratos dos presos, atualmente estes mesmos grupos clamam para que os presos “famosos” sejam submetidos às mesmas condições do total da população carcerária.

A prisão dos “famosos” não tem servido sequer para chocar a opinião pública sobre a falta de atendimento médico, acesso à água potável, imposição da revista vexatória aos familiares entre outras tantas maldades impostas pelos agentes do Estado.

Cegos pela vingança e interesses político-partidários, imprensa e setores da classe média não informam corretamente que o atendimento médico, o respeito aos visitantes, o acesso à alimentação adequada e outras medidas exigidas por advogados e familiares dos presos “famosos” são direitos, previstos em normas nacionais e internacionais, como a Constituição Federal e a Lei de Execução Penal (Lei Federal 7.210/1984).

A única diferença entre os presos que tem ocupado o noticiário e o geral da população carcerária é a possibilidade de acesso à justiça, também um direito, mas negado à quase totalidade das pessoas presas por um único motivo: são pobres, com baixa escolaridade, que não podem pagar advogados nem têm acesso à informação, dependendo, ainda, da caridade das igrejas e da incompetência e inoperância dos governos estaduais, responsáveis pela execução das penas.

Os esforços do Governo Federal, por meio dos Ministérios da Justiça, Saúde, Educação, Trabalho e outros órgãos no sentido de cumprir a legislação e garantir a punição, com o respeito aos direitos humanos, têm sido barrados pelas estruturas locais, que não acessam e implementam os programas e recursos disponibilizados, sem contar os empecilhos colocados para a não realização dos mutirões penitenciários.

Obviamente todos estes esforços são insuficientes e, ainda que as ações fossem implementadas, a prisão permaneceria como um órgão violador de direitos, pois, como está organizada entre nós, mistura pessoas com delitos muito diferentes, constituindo-se em uma escola do crime. A prisão não recupera, mas estimula mais violência.

Continuamos defendendo as penas alternativas e que as prisões ofereçam políticas públicas que possibilitem condições para que, quando conquistarem a liberdade, os egressos assumam seu lugar de cidadania na sociedade. 

Neste Dia Internacional dos Direitos Humanos, reafirmaremos aquilo que temos praticado e defendido ao longo de toda a vida: todas as pessoas têm direito a todos os direitos, inclusive as presas, sejam “famosas” ou anônimas.


Saudações PeTistas,

Geraldo Cruz
Deputado estadual